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quarta-feira, 20 de maio de 2015

As Muralhas de Concreto

Fonte: construir.daysesene.com (2015)



Valter Machado da Fonseca

Por entre as muralhas escapam os gritos de pavor
São animais ensanguentados, assustados e maltratados
Os dias parecem parar, são intermináveis, infindáveis
Nos corredores escuros, malcheirosos, o som dos passos ritmados
As barras de ferro batido deixam escapar apenas os gemidos
Dos homens sem vaidade, embrutecidos pelo ódio da falta de dignidade

O tempo passa em conta-gotas, no tic-tac do tormento
São homens amarelos de pele encharcada no suor da opressão
Na rotina da masmorra só se ouve o lamento da frustração
No dia-a-dia do cativeiro são constantes as batidas secas
Das ferramentas frias da tortura e da enxada do coveiro

Nas noites frias de inverno, eles estão lá dentro
Das suas mentes obstinadas, saem imagens distorcidas das amadas
Aos poucos, com o passar dos anos, o tempo não interessa
Trancam suas mentes, confinam o pensamento, se adaptam ao sofrimento
Da paisagem distante do outro lado do muro de concreto
Só restaram algumas imagens distorcidas pelo tormento

Alguns que insistem em resistir procuram se iludir
Com o corpo preso nas velhas camas de cimento, liberam o pensamento
Precisam, todo dia, banhados na pouca claridade, acalentar a liberdade
Pensam nos amigos, nos conhecidos e nas amadas lá de fora
Procuram, travestidos de ilusão, enganar a frustração
O pensamento sai do catre pra se juntar à multidão

O tempo passa lentamente, a hora chega de mansinho
No dia-a-dia da cadeia, se entusiasmam, fazem planos com carinho
Esperam com paciência o dia de glória que aos poucos se aproxima
Contam os meses, as semanas, os dias, os minutos
Com os corações acelerados, esperam deslumbrados
O grande dia que trará consigo a liberdade

Finalmente, chega o dia, o momento tão esperado
Arrumam as coisas, fazem as malas, preparam o coração
Juntam os poemas, relembram das conversas dos que vão ficar
Tentam ser fortes, se erguem, prendem o fôlego que esconde o choro
Chegou o grande momento, de ir embora, atravessar o portão
O corpo vergado, flácido, caminha lentamente na multidão
Enquanto o coração partido, sofrido, volta para dentro da prisão.


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