Prof. Dr.
Valter Machado da Fonseca*
Para compreendermos o
lugar ocupado pela escola/educação no interior da sociedade atual é preciso que
apreendamos as características gerais assumidas por este modelo de sociedade.
Neste sentido, é fundamental que percebamos também a nova caracterização do Estado
moderno, cuja política influencia, diretamente, a dinâmica da sociedade e das
instituições em seu interior.
A conjuntura política e econômica que marca a
sociedade atual é fruto da nova dinâmica das forças produtivas que movem as
engrenagens da sociedade capitalista nos dias atuais. Vivemos em uma sociedade
que tem como características básicas o investimento em novas tecnologias,
visando a garantir a plena expansão e reprodução do capital. Essas tecnologias
evoluíram no sentido de diminuição do tempo de produção e circulação das novas
mercadorias, o que permite ao capital se tornar volátil e circular o planeta
com novas capacidades de especulação em diversos mercados financeiros mundiais.
Ao mesmo tempo em que o capital se volatiliza em
busca de mercados que possam se moldar à sua plena expansão e reprodução, ele
também gira o planeta em busca de mão de obra barata, deixando, assim, os
trabalhadores à mercê de novas formas de exploração, impostas, sobretudo, pela
precarização do trabalho humano, por intermédio da terceirização e do
sobretrabalho. Estas são características que marcam a nova ordem econômica
mundial: a denominada globalização econômica.
“Globalização econômica” ou “Globalização neoliberal” é caracterizada
pela diminuição do tempo de produção e circulação de mercadorias e serviços,
por intermédio de investimentos tecnológicos nas áreas de informação,
telecomunicações, transportes e em especial, na informática. Na denominada
“Globalização econômica” ocorre uma nova configuração na relação espaço/tempo,
onde ocorre uma diminuição do espaço, por intermédio do aumento da velocidade
das informações, dos transportes e das telecomunicações. Isto se dá, graças ao
desenvolvimento extraordinário da informatização e da Rede mundial de
computadores (Internet). Diante desse quadro, o capital se volatiliza e cria
novas necessidades e novos desejos, em função das necessidades de florescimento
da mais-valia, motor principal do atual modelo econômico de produção. Neste
sentido, é importante analisarmos a definição de capital formulada por David
Harvey:
O
capital é um processo, e não uma coisa. É um processo da vida social por meio
da produção de mercadorias em que todas as pessoas do mundo capitalista
avançado estão profundamente implicadas. Suas regras internalizadas de operação
são concebidas de maneira a garantir que ele seja um modo dinâmico e
revolucionário de organização social que transforma incansável e
incessantemente a sociedade em que está inserido. O processo mascara e
fetichiza, alcança crescimento mediante a destruição criativa, cria novos
desejos, transforma espaços e acelera o ritmo da vida. Ele gera problemas de
superacumulação para os quais há apenas um número limitado de soluções possíveis.
(HARVEY, 2005, p.307)
Harvey (2005) foi de grande felicidade na elaboração
do conceito de capital. Podemos verificar que a denominada “Globalização”
neoliberal tem como característica central a capacidade do capital em se
metamorfosear buscando a criação de novos desejos e necessidades visando á
superação de suas crises cíclicas. A sociedade moderna, também denominada de
“sociedade do conhecimento” transforma-se, essencialmente, em sociedade do
consumo, acima de qualquer coisa. Para seguir a nova dinâmica reprodutiva do
capital, o Estado moderno também se transforma, visando à adequação das
demandas sociais e econômicas, suprindo as lacunas deixadas pelo chamado
“socialismo real” e, ao mesmo tempo para amortecer o choque entre as classes
sociais. Assim, em diversos locais, o Estado lança mão de uma receita a muito
conhecida, a socialdemocracia, o que vai garantir-lhe governabilidade e, ao
mesmo tempo, dar-lhe o caráter de legitimidade. A receita socialdemocrata volta
a ser utilizada em diversas nações do mundo e, em especial na América Latina,
com ênfase para o Brasil.
O Brasil no contexto da nova ordem
econômica globalizante e a política educacional
O
Brasil, em particular, é uma nação onde podemos fazer uma leitura clássica da
capacidade de o Estado se metamorfosear. O papel do Estado brasileiro também
cumpre as determinações da dita economia globalizante. Como país estratégico
para os planos da economia capitalista e ainda como válvula de escape para
salvaguardar a crise do modelo capitalista, o Brasil surge como o grande
laboratório para a reinvenção do Estado capitalista. No Brasil, podemos
verificar que a socialdemocracia cumpriu duas etapas para garantir a
efetividade das reformas capitalistas em curso no mundo: a primeira etapa (a
mais amarga) foi cumprida nos oito anos de governo Fernando Henrique Cardoso.
Nesta fase, coube ao governo FHC implementar as políticas de enxugamento da
máquina estatal, por intermédio dos cortes nos gastos sócias, na efetivação da
política de privatizações e controle dos gastos públicos. A segunda fase ou
fase “camaleão” a figura de Lula e seu partido foram trabalhadas de maneira
sutil e dissimulada, visando dar à socialdemocracia seu caráter efetivamente
social, marcada pela política de um governo da colaboração de classes
“preocupado” fundamentalmente com as questões sociais. Aí, foi determinante o
papel desempenhado pelo governo social democrata e populista de Lula e sua
equipe. Esta política passa a ideia da inexistência de uma crise mundial do
capital, acaba adiando as consequências desta crise no país. Agora, no governo
Dilma, o Estado capitalista começa a mostrar a sua face, inicia-se um processo
de endurecimento do Estado perante as conquistas da população.
Aqui
é importante a contribuição de Lima (2009);
No quadro das reformas gerais, operadas
em consonância ao modelo de Estado redefinido a partir da economia política
capitalista globalizante, é que se inscreve a reorganização educacional
implementada a partir dos anos 1990. Contexto em que o conceito de público é
desvinculado do Estado e a democracia é reafirmada por meio da
representatividade, de modo a escamotear a possibilidade da participação ativa
da sociedade civil nas discussões e determinações políticas. [...] uma nova
configuração é estabelecida para os serviços públicos, a partir do que o Brasil
e países da América Latina passam a seguir as orientações dos organismos
internacionais multilaterais, adequando-se a uma política fundamentada nas
reformas estruturais, necessárias pra um, então, novo modelo de Estado.
Portanto, as reformas passam a ser o carro-chefe dos discursos oficiais,
conjuntamente com o discurso de ajustamento do Estado ao mercado. (LIMA, 2009,
p25-26. passim)
O
fragmento textual de Lima (2009) reproduz, com fidelidade, o que de fato
ocorreu no Brasil para implantação dos princípios neoliberais. No quadro
político e econômico brasileiro se configura dentro das propostas neoliberais
para o país, conforme ficou demonstrado nos últimos dezesseis anos de governo
(FHC e Lula), duas faces de uma mesma moeda, que mostram um panorama geral de
reformas em cumprimento eficiente do receituário neoliberal para a América
Latina, para a qual o Brasil seria o modelo a ser seguido.
De
fato, a globalização enfraquece o Estado nacional e
reduz sua capacidade de universalizar direitos, como uma educação de qualidade
para todos. Ao mesmo tempo, precariza as condições de trabalho, deixando o
educador, como todos os trabalhadores, à mercê de crescentes taxas de
desemprego e decrescentes taxas de salário real. A globalização coloca em xeque
o poder dos Estados nacionais dentro e fora de seus territórios. Condiciona ou
determina as decisões estatais, não apenas no campo financeiro ou comercial,
mas, igualmente, no político, de segurança e de organização dos sistemas
educativos, de saúde e de previdência social. Ela questiona a credibilidade do
Estado como construtor de sociedade e, pelas imposições dos organismos
internacionais de crédito e pela mobilidade do capital financeiro, reduz os
espaços para a diversidade de modelos de organização social e econômica. Em
suma, a globalização afasta, cada vez mais, os países pobres do caminho do
desenvolvimento, entendido como uma conjugação de crescimento rápido e
autossustentado, avanço tecnológico, melhoria dos indicadores sociais e
ambientais.
Na América Latina, região em que a busca do desenvolvimento se
fizera por uma industrialização induzida ou feita pelo Estado, por intermédio
da substituição de importações, o choque foi expressivo. Seu aríete o Consenso
de Washington, da década de 1990. A cartilha do Banco Mundial chegou ao Brasil
e a toda região uma só receita para alçar-se ao mundo desenvolvido: reforma
fiscal, aumento dos gastos públicos em educação e saúde, reforma tributária,
taxas de juros determinadas pelo mercado, taxas de câmbio competitivas, abertura
comercial e ao investimento direto externo, privatização e desregulamentação.
Em um mundo homogeneizado, a diversidade representa uma ameaça a um sistema
mundial elitista e concentrador dos frutos da economia.
A última
década do século passado fez-se acompanhar por profundas mudanças nos campos
político, social e econômico, eliminando direitos até então tidos como
universais. No mundo do trabalho, aumento do mercado informal e da
terceirização; no mundo da natureza, degradação.
Referências
HARVEY, David. A produção capitalista do espaço. São
Paulo: Annablume, 2005. (Coleção Geografia e Adjacências)
LIMA, Antonio
Bosco de. Estado, educação e controle social: introduzindo o tema. In: Estado e controle social no Brasil.
Antonio Bosco de Lima (org.). Uberlândia: Composer; Fapemig; GPEDE, 2009, p.
17-36.
*
Escritor. Geógrafo, Mestre
e Doutor pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Professor e pesquisador
das temáticas “Alterações Climáticas” e “Impactos socioambientais sobre os
ecossistemas terrestres e aquáticos”. pesquisa.fonseca@gmail.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário