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quinta-feira, 15 de maio de 2014

A ESCOLA/EDUCAÇÃO NO CONTEXTO DA SOCIEDADE MODERNA

Prof. Dr. Valter Machado da Fonseca*

Para compreendermos o lugar ocupado pela escola/educação no interior da sociedade atual é preciso que apreendamos as características gerais assumidas por este modelo de sociedade. Neste sentido, é fundamental que percebamos também a nova caracterização do Estado moderno, cuja política influencia, diretamente, a dinâmica da sociedade e das instituições em seu interior.
A conjuntura política e econômica que marca a sociedade atual é fruto da nova dinâmica das forças produtivas que movem as engrenagens da sociedade capitalista nos dias atuais. Vivemos em uma sociedade que tem como características básicas o investimento em novas tecnologias, visando a garantir a plena expansão e reprodução do capital. Essas tecnologias evoluíram no sentido de diminuição do tempo de produção e circulação das novas mercadorias, o que permite ao capital se tornar volátil e circular o planeta com novas capacidades de especulação em diversos mercados financeiros mundiais.
Ao mesmo tempo em que o capital se volatiliza em busca de mercados que possam se moldar à sua plena expansão e reprodução, ele também gira o planeta em busca de mão de obra barata, deixando, assim, os trabalhadores à mercê de novas formas de exploração, impostas, sobretudo, pela precarização do trabalho humano, por intermédio da terceirização e do sobretrabalho. Estas são características que marcam a nova ordem econômica mundial: a denominada globalização econômica.  “Globalização econômica” ou “Globalização neoliberal” é caracterizada pela diminuição do tempo de produção e circulação de mercadorias e serviços, por intermédio de investimentos tecnológicos nas áreas de informação, telecomunicações, transportes e em especial, na informática. Na denominada “Globalização econômica” ocorre uma nova configuração na relação espaço/tempo, onde ocorre uma diminuição do espaço, por intermédio do aumento da velocidade das informações, dos transportes e das telecomunicações. Isto se dá, graças ao desenvolvimento extraordinário da informatização e da Rede mundial de computadores (Internet). Diante desse quadro, o capital se volatiliza e cria novas necessidades e novos desejos, em função das necessidades de florescimento da mais-valia, motor principal do atual modelo econômico de produção. Neste sentido, é importante analisarmos a definição de capital formulada por David Harvey:
O capital é um processo, e não uma coisa. É um processo da vida social por meio da produção de mercadorias em que todas as pessoas do mundo capitalista avançado estão profundamente implicadas. Suas regras internalizadas de operação são concebidas de maneira a garantir que ele seja um modo dinâmico e revolucionário de organização social que transforma incansável e incessantemente a sociedade em que está inserido. O processo mascara e fetichiza, alcança crescimento mediante a destruição criativa, cria novos desejos, transforma espaços e acelera o ritmo da vida. Ele gera problemas de superacumulação para os quais há apenas um número limitado de soluções possíveis. (HARVEY, 2005, p.307)
Harvey (2005) foi de grande felicidade na elaboração do conceito de capital. Podemos verificar que a denominada “Globalização” neoliberal tem como característica central a capacidade do capital em se metamorfosear buscando a criação de novos desejos e necessidades visando á superação de suas crises cíclicas. A sociedade moderna, também denominada de “sociedade do conhecimento” transforma-se, essencialmente, em sociedade do consumo, acima de qualquer coisa. Para seguir a nova dinâmica reprodutiva do capital, o Estado moderno também se transforma, visando à adequação das demandas sociais e econômicas, suprindo as lacunas deixadas pelo chamado “socialismo real” e, ao mesmo tempo para amortecer o choque entre as classes sociais. Assim, em diversos locais, o Estado lança mão de uma receita a muito conhecida, a socialdemocracia, o que vai garantir-lhe governabilidade e, ao mesmo tempo, dar-lhe o caráter de legitimidade. A receita socialdemocrata volta a ser utilizada em diversas nações do mundo e, em especial na América Latina, com ênfase para o Brasil.
O Brasil no contexto da nova ordem econômica globalizante e a política educacional      
O Brasil, em particular, é uma nação onde podemos fazer uma leitura clássica da capacidade de o Estado se metamorfosear. O papel do Estado brasileiro também cumpre as determinações da dita economia globalizante. Como país estratégico para os planos da economia capitalista e ainda como válvula de escape para salvaguardar a crise do modelo capitalista, o Brasil surge como o grande laboratório para a reinvenção do Estado capitalista. No Brasil, podemos verificar que a socialdemocracia cumpriu duas etapas para garantir a efetividade das reformas capitalistas em curso no mundo: a primeira etapa (a mais amarga) foi cumprida nos oito anos de governo Fernando Henrique Cardoso. Nesta fase, coube ao governo FHC implementar as políticas de enxugamento da máquina estatal, por intermédio dos cortes nos gastos sócias, na efetivação da política de privatizações e controle dos gastos públicos. A segunda fase ou fase “camaleão” a figura de Lula e seu partido foram trabalhadas de maneira sutil e dissimulada, visando dar à socialdemocracia seu caráter efetivamente social, marcada pela política de um governo da colaboração de classes “preocupado” fundamentalmente com as questões sociais. Aí, foi determinante o papel desempenhado pelo governo social democrata e populista de Lula e sua equipe. Esta política passa a ideia da inexistência de uma crise mundial do capital, acaba adiando as consequências desta crise no país. Agora, no governo Dilma, o Estado capitalista começa a mostrar a sua face, inicia-se um processo de endurecimento do Estado perante as conquistas da população.
Aqui é importante a contribuição de Lima (2009);
No quadro das reformas gerais, operadas em consonância ao modelo de Estado redefinido a partir da economia política capitalista globalizante, é que se inscreve a reorganização educacional implementada a partir dos anos 1990. Contexto em que o conceito de público é desvinculado do Estado e a democracia é reafirmada por meio da representatividade, de modo a escamotear a possibilidade da participação ativa da sociedade civil nas discussões e determinações políticas. [...] uma nova configuração é estabelecida para os serviços públicos, a partir do que o Brasil e países da América Latina passam a seguir as orientações dos organismos internacionais multilaterais, adequando-se a uma política fundamentada nas reformas estruturais, necessárias pra um, então, novo modelo de Estado. Portanto, as reformas passam a ser o carro-chefe dos discursos oficiais, conjuntamente com o discurso de ajustamento do Estado ao mercado. (LIMA, 2009, p25-26. passim)      

O fragmento textual de Lima (2009) reproduz, com fidelidade, o que de fato ocorreu no Brasil para implantação dos princípios neoliberais. No quadro político e econômico brasileiro se configura dentro das propostas neoliberais para o país, conforme ficou demonstrado nos últimos dezesseis anos de governo (FHC e Lula), duas faces de uma mesma moeda, que mostram um panorama geral de reformas em cumprimento eficiente do receituário neoliberal para a América Latina, para a qual o Brasil seria o modelo a ser seguido. 
De fato, a globalização enfraquece o Estado nacional e reduz sua capacidade de universalizar direitos, como uma educação de qualidade para todos. Ao mesmo tempo, precariza as condições de trabalho, deixando o educador, como todos os trabalhadores, à mercê de crescentes taxas de desemprego e decrescentes taxas de salário real. A globalização coloca em xeque o poder dos Estados nacionais dentro e fora de seus territórios. Condiciona ou determina as decisões estatais, não apenas no campo financeiro ou comercial, mas, igualmente, no político, de segurança e de organização dos sistemas educativos, de saúde e de previdência social. Ela questiona a credibilidade do Estado como construtor de sociedade e, pelas imposições dos organismos internacionais de crédito e pela mobilidade do capital financeiro, reduz os espaços para a diversidade de modelos de organização social e econômica. Em suma, a globalização afasta, cada vez mais, os países pobres do caminho do desenvolvimento, entendido como uma conjugação de crescimento rápido e autossustentado, avanço tecnológico, melhoria dos indicadores sociais e ambientais.
Na América Latina, região em que a busca do desenvolvimento se fizera por uma industrialização induzida ou feita pelo Estado, por intermédio da substituição de importações, o choque foi expressivo. Seu aríete o Consenso de Washington, da década de 1990. A cartilha do Banco Mundial chegou ao Brasil e a toda região uma só receita para alçar-se ao mundo desenvolvido: reforma fiscal, aumento dos gastos públicos em educação e saúde, reforma tributária, taxas de juros determinadas pelo mercado, taxas de câmbio competitivas, abertura comercial e ao investimento direto externo, privatização e desregulamentação. Em um mundo homogeneizado, a diversidade representa uma ameaça a um sistema mundial elitista e concentrador dos frutos da economia.
A última década do século passado fez-se acompanhar por profundas mudanças nos campos político, social e econômico, eliminando direitos até então tidos como universais. No mundo do trabalho, aumento do mercado informal e da terceirização; no mundo da natureza, degradação.
Referências
HARVEY, David. A produção capitalista do espaço. São Paulo: Annablume, 2005. (Coleção Geografia e Adjacências)
LIMA, Antonio Bosco de. Estado, educação e controle social: introduzindo o tema. In: Estado e controle social no Brasil. Antonio Bosco de Lima (org.). Uberlândia: Composer; Fapemig; GPEDE, 2009, p. 17-36.


* Escritor. Geógrafo, Mestre e Doutor pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Professor e pesquisador das temáticas “Alterações Climáticas” e “Impactos socioambientais sobre os ecossistemas terrestres e aquáticos”. pesquisa.fonseca@gmail.com

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